quinta-feira, 14 de maio de 2015

As lentes de névoa sobre os conceitos de CONTEXTO

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Por Germano Xavier


DIJK, Teun A. van. Discurso e Contexto: uma abordagem sociocognitiva. São Paulo: Contexto, 2012.


No capítulo de abertura de seu livro DISCURSO E CONTEXTO: UMA ABORDAGEM SOCIOCOGNITIVA, o linguista holandês Teun A. van Dijk, renomado pesquisador das relações existentes entre texto e contexto (e suas adjacências), elabora um amplo panorama acerca da percepção histórica do “senso de contexto” vigente a partir e, também, durante o surgimento de diversas disciplinas e/ou esferas do saber humano.

O senso que se forma, desde então, ao derredor do conceito de contexto, pode ser considerado, segundo o autor supracitado, como tomado por uma névoa excessiva e prejudicial ao desenvolvimento da matéria. Sem saber distinguir ou deixando-se emaranharem por uma teia até demais desorganizada, as ciências terminaram por intuir uma noção de contexto indefinida, sem a complexidade necessária e, por assim dizer, confusa.

Com o foco de contradições estabelecido nos primórdios das pesquisas envolvendo a problemática contextual, os fins de uso de tal concepção e ideário ficaram à mercê de propostas quase que isoladas e bastante ousadas realizadas por pequenos grupos de estudiosos que, apontando caminhos e possíveis resultados bem discrepantes das construções óbvias já existentes, fizeram com que os meandros do contexto começassem a ser investigados numa crescente de organização nunca antes vista. 

Para explicitar um pouco da real importância e da costumeira necessidade de tal ramo de estudo, Teun A. van Dijk nos coloca diante de um discurso do primeiro-ministro britânico Tony Blair, pronunciado na Câmara dos Comuns em 18 de março de 2003. A partir da leitura do texto emitido por Blair, Dijk apresenta-nos aos princípios básico-naturais (noções gerais) do que poderia vir a ser objeto de conceituação de ordem contextual, elucidando a combinação real texto-em-contexto, fazendo-nos observar que o texto não é um elemento imóvel em si, impermeável e separado das construções socioculturais de um determinado povo ou de um determinado momento histórico, até porque, como já sabemos, o texto é local de interações as mais diversas. E como bem aponta Dijk, entender o discurso é antes realizar a compreensão texto/conversação-em-contexto. 

A natureza do contexto, para Dijk, é múltipla. Não há como identificar um só nascedouro para o elemento em questão. Sendo um objeto que atende às demandas subjetivas de cada ser vivente que se prostre diante de um dado fenômeno, a concepção de contexto envolvida tende a ganhar roupagens e condições de atuação não congruentes. A natureza do contexto, destarte, pode ser considerada mutante.

Disciplinas como a Literatura, a Semiótica, as Artes em geral e até a própria Linguística, quando de seus primeiros embates para com as situações de existência dos con-textos, imbuíram-se de limitar suas percepções quanto a uma possível Teoria do Contexto a estratégias “formalistas”, “estruturalistas” e “transformacionais”, o que as colocou diante de uma escaramuça ideológica de difícil solução. 

Somente após os anos 60 do século XX, com o aprimoramento de interdisciplinas hoje fundamentais para o entendimento das evoluções contextuais, como a Semântica, a Pragmática e todas as suas ramificações, é que o contexto começou a ser lido com os olhos menos nublados. Estas novas ciências iniciaram uma preocupação direcionada à investigação do significado das sentenças linguísticas em geral (Semântica), como também interessadas no uso e nas intenções presentes nestas sentenças. 

Ligadas não somente pelo fato de estarem em constante contato com as diversas facetas do significado, mas também por serem sistemas que interagem com outros ramos do saber para melhor produzir e investigar os seus respectivos objetos de estudo, as novas ciências do significado, ou por assim dizer novas interdisciplinas, começaram a se estruturar, alicerçando passos importantes para o futuro das análises envolvendo o contexto. Nomes como os de Bréal, Saussure, Frege, Grice, Benveniste, Ducrot e Austin, espécie de panteão de lideranças destas novas fontes de pesquisa-saber, não podem ser esquecidos jamais em suas particulares relevâncias, mesmo a maioria deles não atentando diretamente para os fenômenos do contexto, ou seja, mesmo se atrelando mais às particularidades do contexto verbal, também conhecido por cotexto.

Dijk observa que a partir dos anos 70 do século passado, com o advento da ANÁLISE DE DISCURSO CRÍTICA (ADC) e com a aproximação feita por parte da Sociologia, Etnografia, Antropologia e a Psicologia, entre outros, o contexto ganhou status de objeto de estudo definido e definidor, enveredando-se pela crítica e pelos usos sociopolíticos da língua. 

Os fenômenos contextuais foram, na visão de Dijk, acentuados no que dizem respeito aos seguintes padrões de entendimento: 1) Os contextos são construtos subjetivos dos participantes; 2) Os contextos são experiências únicas; 3) Os contextos são modelos mentais; 4) Os contextos são um tipo específico de modelo da experiência; 5) Os modelos de contexto são esquemáticos; 6) Os contextos controlam a produção e compreensão do discurso; 7) Os contextos têm bases sociais; 8) Os contextos são dinâmicos; 9) Com frequência, os contextos são amplamente planejados, entre tantos outros aspectos que serviram de espectro para a mudança de prisma já citada.

Convenhamos, a verdade é que Dijk esmiúça a noção de contexto para nos alocar até ela e fazer com que a tenhamos mais próxima de nossas retinas, sem qualquer forma de embaçamento. A teoria, para tanto, não pode ser descartada. O senso comum jamais dará conta de resolver todos os problemas envolvendo as preocupações contextuais. Aos interessados, um rol de possibilidades se ergue depois de lermos Dijk.


* Imagem:  http://linguagemsemfronteiras.blogspot.com.br/2011/07/resenha-discurso-e-mudanca-social.html

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